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segunda-feira, 7 de outubro de 2013

O DOUTOR E A ROCEIRA
1 - DC
Peguei lápis e papel
Pra botar neste cordel
Dois modos de se viver:
O morador da cidade,
E quem deu prioridade
No campo permanecer.
2 - DC
E para exemplificar
Num debate vou mostrar
Este mundo diferente
Onde cada habitante
De modo interessante
Defende seu ambiente.
3 - DC
Sem futrica e muito fardo
Vou ver Carlos Eduardo
Conversando com Maria
Eu não vou interferir
Apenas quero ouvir
O papo que se inicia.
4 - MC
Sou Maria Campesina
Nesta terra alencarina
Sou poeta popular
Nunca frequentei escola
Mas carrego na cachola
O gosto por versejar.

5 - CE
Eu sou Carlos Eduardo
Sou sujeito estudado,
Aprendi bem a lição
Também me tornei poeta
E seguindo esta meta
Sou mestre na criação.
6 - MC
Eu nasci num lugarejo
E nunca foi meu desejo
Da minha estância sair
Gosto da vida na roça
Lá tem mais do que palhoça
Nem esquento com porvir.
7 - CE
Já eu sou um citadino
Com a capital me afino
Pois lá tenho condições
De fazer bonita história
Crescer e alcançar glória
Ter boas colocações.
8 - MC
Eu canto a natureza
Me encanto com a beleza
Deste meu rude sertão
Eu canto matas e rios
E encaro os desafios
Só usando inspiração.
9 - CE
Eu canto os verdes mares,
Praias, vagas singulares
Um canto da capital.
Canto com facilidade
Canto a modernidade
De uma vida sem igual.
10 - MC
Quando chega o fim do dia
Vejo a lua que alumia
O meu querido torrão
E curto a boca da noite
O vento vem como açoite
E afaga meu coração.
11 - CE
Já eu, abro meu terno,
Na verdade é um inferno...
O tal engarrafamento.
Pego o meu automóvel
Sigo para meu imóvel
Nesta hora eu lamento.
12 - MC
Aqui monto meu jumento
E sem aborrecimento
Eu vou a qualquer lugar
E ninguém para meu trote
Às vezes vou a galope
Pra mais ligeiro chegar.
13 - CE
Para não me aborrecer
Eu resolvo me entreter,
Ligando meu som potente.
Também uso o celular
Pois o trânsito é devagar
Tenho que ser paciente.
14 - MC
Pois eu armo minha rede
Taco meu pé na parede
Começo a me balançar
Se alguém toca um violão
Sendo bonita a canção,
Também me dano a cantar.
15 - CE
Chego em casa estressado
Ligo o ar condicionado,
Computador, televisão.
Navego na internet,
Esta rede que promete,
Ao mundo nova visão.
16 - MC
Eu moro numa casinha,
De reboco, mas é minha
Sem grade pra me prender
Eu corro pelas campinas
Nestas terras nordestinas
Terra que me viu nascer.
17 - CE
Meu prédio é todo cercado
Tem grade de todo lado.
A segurança é total.
Eu subo de elevador
Com ar de grande senhor
E tenho até serviçal.
18 - MC
No meu rancho singelo
O amanhecer é tão belo
Com a passarada a cantar.
Galo canta outro responde
Vejo o sol que não se esconde,
Resplandecente a brilhar.
19 - CE
Acordo com um rumor
Do hábil despertador
Barulhento a me acordar.
E corro para a labuta,
Pois a vida é uma luta,
A qual tenho que enfrentar.
20 - MC
Eu bem sei que sou roceira    
Não estou pra brincadeira
Meu senhor, não leve a mal
Vou confessar a verdade
Adoro a simplicidade
Da minha vida rural.
21 - CE
Eu na cidade nasci,
De tudo aqui aprendi
Rezo mesmo neste altar.
Gosto de morar no alto
De pisar no negro asfalto,
Onde prefiro habitar.
22 - MC
É melhor viver numa oca
Dando tapa em muriçoca,
E peteleco em mutuca.
Do que viver agastada
Levando vida agitada
Que nem vida de maluca.
23 - CE
Já eu penso diferente
Não viveria contente
Se eu residisse no campo
Vivo em outra conjuntura
É outra minha cultura
É na cidade meu trampo
24 - MC
Quando o dia principia
Vejo em cores a magia
Tingindo o meu sertão.
A natureza acordando
O rei sol se espreguiçando
É um poema meu chão!
25 - CE
Do alto de minha janela
Vejo uma paisagem bela
E transbordo de alegria
Mirando o raiar do sol
Entrevejo no arrebol
Indícios de poesia!
26 - MC
Quando vejo um passarinho
Cantando, fazendo ninho,
Eu agradeço ao Senhor
E bendigo a natureza
Isto sim chamo riqueza!
Acredite seu Doutor.
27 - CE
Minha cara camponesa
Um pouco desta beleza
Só vejo em parque e jardim
Quando vou me exercitar,
Espairecer ou relaxar
Cuidar um pouco de mim.
28 - MC
Eu fiz minha louvação
Ao meu amado rincão
Ao meu solo querido
E escutei com emoção
A sua declaração
Ao seu lugar preferido.
29 - CE
Respeito sua opinião,
Quero como cidadão,
Também ser bem respeitado.
Acatar a diferença,
É marcar boa presença
E num combate elevado
30 - MC
Sou Maria Campesina
Eu falei da minha sina
Da minha vida roceira
Desta vida que me agrada
Não troco ela por nada
Adoro minha ribeira.
31 - CE
Eu sou Carlos Eduardo
Também falei sem resguardo
D’onde gosto de morar
Vivo na cidade grande
Onde o progresso brande
Onde finquei o meu lar.
32 - DC
Assim termina a contenda
Sem rasura sem emenda
Com extensa explanação
Para meu contentamento
Valeu, sim, cada argumento,
Exposto na preleção.
Fim

4 comentários:

  1. Dalinha,cara parceira.
    Nem sempre o praciano, com seu terno e seus problemas viveu somente na cidade grande. às vezes ele é tão apaixonado pelo campo e por essa vida tão gostosa que Maria Campesina descreve com eloquência e paixão, quanto qualquer caboclo. Quem sabe o pouco tempo que ele dispõe faz com que a intensidade do seu amor pelo rural supere a distância física que lhe prende à vida da cidade. Eu sou um caboclo assim. Saudoso de um não sei quê, ou sei... das vivências curtas mas intensas que eram como um oásis na vida comum da cidade. MAs será que o inverso não é verdadeiro também? Um dia, lembrando-me dos bons tempos, embora curtos, vividos em fazendas e engenhos, sentindo essa ruralidade gostosa, escrevi esse xote, cuja letra vai abaixo, em homenagem a todos os que ainda têm na alma o viver simples do campo.

    CABOCLO DA CIDADE

    Sou praciano, tenho um pé nesta cidade
    Larguei nos brejos metade do coração
    Bati porteira, galopei atrás de gado
    Na capoeira, no tempo da apartação

    Morena, minha menina
    Sem ti meu verso
    quebra o pé e perde a rima
    Morena, pé de fulô
    dos óio verde
    que já me desconjuntou

    Pesquei traíra, me banhei no açude raso
    Não faço caso de cavalo mandingueiro
    Montei rudado, melado, castanho e gazo
    Gosto do mato sem precisar ser vaqueiro

    Morena, minha menina
    Sem ti meu verso quebra o pé e perde a rima
    Morena, pé de fulô
    Dos óio verde que já me desconjuntou

    Gosto do cheiro da macela e do velame
    Não sei como chame toda essa roedeira
    Que eu sinto a toa quando passo lá na serra
    Naquela terra de uma morena faceira

    Morena, minha menina
    Sem ti meu verso quebra o pé e perde a rima
    Morena, pé de fulô
    dos óio verde que já me desconjuntou

    Se quiser ouvir a música completa (que gravei me acompanhando de viola, violão, sanfona e percussão) clique aqui:

    http://www.4shared.com/mp3/X6ml6nYo/caboclo_da_cidade.html

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    Respostas
    1. Fred,
      Você noutra encarnação foi um menino vadio do interior, não tenho dúvidas, e por isso traz na alma e nos versos a cantiga do sertão.
      Amei a letra do seu xote, mas não consegui ouvir. Mande para meu e-mail para ver se eu consigo.
      Meu abraço

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  2. Pode crer, Dalinha.. é assim que eu me sinto mesmo. Meio cigano, meio sertanejo. Cigano nas atitudes e no viajar. Sertanejo no sentimento e no amor a essa Nação Nordestina.

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  3. A cada dia que se passa nós assistimos o cerco se fechando, principalmente, sobre o homem da cidade. O sistema em que vivemos é uma indústria de marginal. Quando um é morto aparecem dois, três para substituí-lo. Será que vale a pena? Eu prefiro o meu sertão, onde o hábito de por as cadeiras nas calçadas para um bom papo ainda se pratica.

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